sexta-feira, 17 de abril de 2009


E quando voltaram pra casa, todas as coisas entraram em foco. Estavam sozinhos, estavam renovados e com medo. E agora? Depois de tudo o que passaram o casamento não os iria salvar. Quiseram os dois voltar atrás, pensaram em ir embora secretamente, quase que ao mesmo tempo - era tão assustador.
Sempre dividiram tudo o que tinham, mas agora era real, agora era irreversível; irreversível? Sim para eles, para os dois que recém tinham mudado suas vidas, era sim. Certas coisas marcam tão fundo, e pra quê? Pra te deixar sofrendo no fim, com as cicatrizes reabrindo, com o fervor do ódio inundando as faces, as palavras ditas, os olhares perdidos.
Tantos anos tinham-se passado, tantas vidas diferentes foram vividas em suas pequenas caixas coloridas, com seu pequeno palhaço dentro. A juventude e o amor carnal tinham ficado para trás. O que fariam agora? O amor já nem era mais o mesmo, mas continuava sendo amor. Era um amor de certa forma ainda juvenil, mas com muitas marcas do tempo. Muitas frustrações e mordidas profundas.
Os dois carregavam um fardo pesado agora, carregavam um ao outro. Não podiam desistir. Afinal em seus dedos levavam a lembrança daquele dia feliz, em que pensaram estarem salvando um ao outro. E de fato, estavam. Mas demorariam mais alguns anos para perceber isso.
Sempre quando ela precisou ele estava la, no vice-versa, nem sempre. Ela tinha mais amigos, mais compromissos, mais vida afora. Sempre fora assim.
Ele havia se apaixonado pelo jeito sincero e sem malícia dela, e ela pelo charme e confiança dele. Ambas as coisas não mais existiam. E o que ficou? Ainda poderiam estar apaixonados?
Pois estavam, ao longo dos longos dez anos juntos, foram descobrindo mais partes um do outro pelas quais podiam apaixonar-se, e assim o fizeram.
Porém o medo que surgiu na juventude os fizera cair.
E não sabiam, se a mesma coragem que também surgira quando eram jovens, ainda existia e muito menos se os ajudaria a levantar.
Pensavam os dois, secretamente, quase que ao mesmo tempo, se já não eram um só outra vez, deixando para trás o até que a morte os separe. Estavam mortos mesmo estando vivos, a chama tinha se apagado, junto com a força para reacendê-la.

Mas continuariam juntos até o fim de suas vidas, senão pelo outro, por eles mesmos. Eram a força apagada.

terça-feira, 14 de abril de 2009


E então ela o olhou ali jogado, morto e gelado por inteiro. Matara-o. Quisera-o. Mas nada saiu como o planejado. Em seus sonhos ela idealizava uma vida impossível. Pelo menos em seu caso perdido. Uma vida na qual a inconstância perdia-se com a insônia, era deixada do lado de fora da porta do seu quarto. Só a entrada dele era permitida. Ela havia preparado tudo, como devia ser. Tinha perdido horas de sono confabulando pretextos que o fizessem ficar mais um pouco. Havia ajeitado a cama, havia escondido os chinelos velhos, trocado a toalha do banheiro e perfumado o quarto com suas canções de amor. Tudo pra que ele se apaixonasse. Ela esperou – e ele não veio. Ela esperou até não agüentar mais, até que suas entranhas berrassem por compaixão – VENHA! - Mas ele nem sequer pensou em aparecer.
Então ela foi até ele. O suor escorrendo pelas mãos, duras, insensíveis. Algo a fizera mudar, endureceu o seu afeto. O pouco que lhe restava, seria feito.

quarta-feira, 1 de abril de 2009


E esse horror nas ruas, esse sangue ambíguo, essa angústia de dois, três, mil lados. Essas tragédias espalhadas pela rua, elas cegam o brilho das estrelas, o aconchego da lua – que eu enxergava sem medo, antes de entender o mundo. Antes de entender que o ser humano tem em sua essência o egoísmo, e com ele manipula tudo ao seu redor. Que não importa o quão sutis e bonitas forem as relações que conseguem uns com os outros, tudo o que se preserva é a ganância e a vontade de destruir. A ternura de uma amizade já não mais existe, nunca mais existirá pura, em seu estado mais primário.
Derramar sangue por puro prazer, discriminar por falsos ideais. Morrer pelos mesmos. Matar – o que é isso? Não é nada, é algo totalmente comum e normal como tomar café depois do almoço. Pessoas passando por pobreza na rua, sem sentirem um pingo de remorso. Pessoa jogando-se na rua, com medo, das bombas que caem. O que se ganha com uma guerra? Honra, medalhas, orgulho? Morte, tragédia, destruição, perdas e remorsos? O que fica pra trás, fica com cada um. Mas a humanidade não aprende, a humanidade pede sangue. Pelo quê?
Não consigo mais andar por esse lugar, longe de toda essa sujeira, e sentir o perfume bom que as coisas emanam, e sentir que tudo vai ficar bem – enquanto o mundo morre lá fora. Ninguém mais anda na rua com o prazer de ver as pessoas, de trocar sentimentos ou seja lá o que for. Todos andam por essas ruas já gastas, achando que o mundo é de cada um, apenas com seus próprios problemas, sem coragem de se doar por uma causa, sem dignidade pra enxergar o verdadeiro mundo aqui fora. Aqui, onde eu vivo agora, as coisas não estão críticas, mas vão ficar. Essa é a minha sina para a humanidade – se auto-destruir. E pelo quê? Ideais que matam, ideais que melhoram uma minoria? Se o ser humano não deixar de ser, humano – se autodestruirá. Amém.